Olá pessoal!!! Tudo bem? Como passaram a semana??
Espero que muito bem.
Essa semana vamos dar um stop no estudo das súmulas do CARF para analisar um instrumento muito importante utilizado atualmente pelo Fisco na seara administrativa para cobrar o crédito tributário.
A constituição do crédito tributário e a elaboração da Certidão de Dívida Ativa são o ponto de partida para que o Fisco possa cobrar o débito do sujeito passivo. Em sequência, com a CDA o Fisco pode optar por realizar a cobrança do crédito tributário pela via administrativa ou pela via judicial com o ajuizamento de uma Execução Fiscal.
Ocorre que na via administrativa, via de regra a cobrança é feita pela inclusão do crédito tributário no Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais, bem como pode ser feito o protesto da CDA no Cartório.
O Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais (Cadin) é regulamentado pela Lei nº 10.522/2002, no entanto, além de alterações efetuadas por outras leis, em 2018 a Lei nº 13.606/2018 realizou uma significativa alteração na cobrança do crédito tributário na via administrativa ao incluir alguns dispositivos na Lei nº 10.522/2002.
Com a edição da Lei nº 13.606/2018 o Fisco passou a dispor de um novo mecanismo para cobrança do crédito tributário, qual seja a possibilidade de averbação pré-executória da CDA. Tal mecanismo foi incluído na Lei nº 10.522/2002 em seu artigo 20-B.
Art. 20-B, Lei nº 10.522/2002. Inscrito o crédito em dívida ativa da União, o devedor será notificado para, em até cinco dias, efetuar o pagamento do valor atualizado monetariamente, acrescido de juros, multa e demais encargos nela indicados.
§ 1o A notificação será expedida por via eletrônica ou postal para o endereço do devedor e será considerada entregue depois de decorridos quinze dias da respectiva expedição.
§ 2o Presume-se válida a notificação expedida para o endereço informado pelo contribuinte ou responsável à Fazenda Pública.
§ 3o Não pago o débito no prazo fixado no caput deste artigo, a Fazenda Pública poderá:
I - comunicar a inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres; e
II - averbar, inclusive por meio eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis.
Conforme se verifica do dispositivo supracitado foi conferido ao Fisco a possibilidade informar a existência da dívida aos bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito, bem como realizar a averbação da CDA nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora e uma vez localizado bens esse poderiam ser tornar indisponíveis.
Sendo assim, diante da permissão conferida pela lei a Procuradoria – Geral da Fazenda Nacional passou a regular o instrumento da averbação pré executória por meio da Portaria PGFN nº 33/2018 e e alterações feitas pela Portaria PGFN nº42/2018, em especial o artigo 7º da Portaria nº 33/2018:
“Art. 7º, Portaria nº 33/2018. Esgotado o prazo e não adotada nenhuma das providências descritas no art. 6º, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá:
I - encaminhar a Certidão de Dívida Ativa para protesto extrajudicial por falta de pagamento, nos termos do art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997;
II - comunicar a inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres, mediante convênio firmado com as respectivas entidades;
III - averbar, inclusive por meio eletrônico, a Certidão de Dívida Ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, para fins de averbação pré-executória;
[...]”
Acontece que não poderia ser outra a reação que não seja a configuração de cenário de completa divergência sobre essa permissão concedida ao Fisco, especialmente quanto ao fato de o próprio Fisco impor a indisponibilidade de bens do devedor. Sendo assim, diante de um cenário de incerteza foram propostas Ações Diretas de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal a fim de que a Corte efetuasse a análise de tais possibilidades concedidas ao Fisco e firmasse um posicionamento quanto a constitucionalidade, especialmente do artigo 20-B, § 3o, incisos I e II da Lei nº 10.522/2002.
As Ações Diretas de Inconstitucionalidade versando sobre tal tema são as seguintes: ADIN 5881, ADIN 5886, ADIN 5890, ADIN 5925, ADIN 5931, ADIN 5932 e estas foram decididas pelo Supremo Tribunal Federal no final do ano de 2020, momento no qual, de modo geral, foi declarada a constitucionalidade do inciso I e o inciso II foi considerado parcialmente constitucional.
Vejamos a ementa de uma dessas Ações Diretas de Inconstitucionalidade:
Direito Constitucional, tributário e processual civil. Ações diretas de inconstitucionalidade. Averbação da Certidão de Dívida Ativa (CDA) em órgãos de registro e indisponibilidade de bens do devedor em fase pré-executória. 1. Ações diretas contra os arts. 20-B, § 3º, II, e 20-E da Lei nº 10.522/2002, com a redação dada pela Lei nº Lei nº 13.606/2018, que (i) possibilitam a averbação da certidão de dívida ativa em órgãos de registros de bens e direitos, tornando-os indisponíveis, após a conclusão do processo administrativo fiscal, mas em momento anterior ao ajuizamento da execução fiscal; e (ii) conferem à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional o poder de editar atos regulamentares. 2. Ausência de inconstitucionalidade formal. Matéria não reservada à lei complementar. Os dispositivos impugnados não cuidam de normas gerais atinentes ao crédito tributário, pois não interferem na regulamentação uniforme acerca dos elementos essenciais para a definição de crédito. Trata-se de normas procedimentais, que determinam o modo como a Fazenda Pública federal tratará o crédito tributário após a sua constituição definitiva. 3. Constitucionalidade da averbação da certidão de dívida ativa em registros de bens e direitos em fase anterior ao ajuizamento da execução fiscal. A mera averbação da CDA não viola o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, a reserva de jurisdição e o direito de propriedade. É medida proporcional que visa à proteção da boa-fé de terceiros adquirentes de bens do devedor, ao dar publicidade à existência da dívida. Além disso, concretiza o comando contido no art. 185, caput, do Código Tributário Nacional, que presume “fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa”. Tal presunção legal é absoluta, podendo ser afastada apenas “na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita”. 4. Inconstitucionalidade material da indisponibilidade de bens do devedor na via administrativa. A indisponibilidade tem por objetivo impedir a dilapidação patrimonial pelo devedor. Todavia, tal como prevista, não passa no teste de proporcionalidade, pois há meios menos gravosos a direitos fundamentais do contribuinte que podem ser utilizados para atingir a mesma finalidade, como, por exemplo, o ajuizamento de cautelar fiscal. A indisponibilidade deve respeitar a reserva de jurisdição, o contraditório e a ampla defesa, por se tratar de forte intervenção no direito de propriedade. 5. Procedência parcial dos pedidos, para considerar inconstitucional a parte final do inciso II do § 3º do art. 20-B, onde se lê “tornando-os indisponíveis”, e constitucional o art. 20-E da Lei nº 10.522/2002, ambos na redação dada pela Lei nº 13.606/2018. (ADI 5881, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-061 DIVULG 30-03-2021 PUBLIC 05-04-2021) (grifos nossos)
Assim, conforme se verifica em razão da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal o Fisco não pode mais adotar a indisponibilidade de bens como meio de cobrar administrativamente o crédito tributário, caso a medida seja realmente necessária e uma vez comprovada essa necessidade, tal medida deverá ser pleiteada na via judicial, momento em que deverá ser concedida a possibilidade de defesa do contribuinte antes de qualquer determinação deferindo a declaração de indisponibilidade. Por outro lado, o Fisco continua podendo informar a existência de dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito.
Portanto, ainda que a decisão do STF tenha definido os limites da permissão conferida pela Lei nº 13.606/2018 para a cobrança administrativa é muito importante ter em mente toda essa discussão envolvendo a temática, especialmente para constatar possíveis irregularidades na cobrança do crédito tributário, para que o contribuinte tome ciência que mesmo não podendo ser decretada a indisponibilidade de seus bens pelo Fisco sem uma decisão judicial, ele (o Fisco) ainda possui uma alternativa para tentar cobrar o crédito tributário na via administrativa, dado que poderá fazer a comunicação da dívida a outros órgão o que pode levar a possíveis restrições de crédito perante estes.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.522 de 19 de julho de 2002. Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências. Brasília, DF, 22 jul. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10522.htm>. Acesso em: 27 abr. 2021.
______. Procuradoria – Geral da Fazenda Nacional. Portaria PGFN nº 33, de 08 de fevereiro de 2018. Regulamenta os arts. 20-B e 20-C da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002 e disciplina os procedimentos para o encaminhamento de débitos para fins de inscrição em dívida ativa da União, bem como estabelece os critérios para apresentação de pedidos de revisão de dívida inscrita, para oferta antecipada de bens e direitos à penhora e para o ajuizamento seletivo de execuções fiscais. Brasília, DF, 09 fev. 2018. Disponível em: http://sijut2.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=90028&visao=anotado. Acesso em: 27 abr. 2021.
______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5881. Relator: MIN. MARCO AURÉLIO. Brasília, DF, 09 de dezembro de 2020. Diário de Justiça Eletrônico. Brasília, 05 abr. 2021. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5341622. Acesso em: 27 abr. 2021.
Escrito por Ana Beatriz da Silva
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