Olá pessoal! Com vocês estão?
Espero que estejam todos bem.
Para essa semana, diante de uma matéria lida por mim (deixarei o link ao final do artigo para quem quiser conferir, nesse é possível consultar também a sentença proferida), em que pese a decisão e a matéria tenham sido divulgadas no mês passado, escolhi apresentar o caso retratado, que apesar do julgamento ter ocorrido na via judicial a decisão teve por base questões ligadas ao processo administrativo, especialmente a análise do caso no CARF. Sendo assim, para os que por ventura já tinham conhecimento da decisão, convido a prosseguir com a leitura e refletir sobre as considerações trazidas ao término da exposição.
Pois bem. O caso a ser apresentado trata-se de uma decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Mogi Mirim nos autos de um processo de Execução de Pena. Sim, estamos falando de um caso de direito penal que teve sua decisão pautada em circunstâncias ocorridas no CARF.
O processo em questão visava dar cumprimento a execução da pena apalicada em razão da condenação do Executado pelo crime previsto no artigo 1º, inciso I da Lei 8.137/1990.
A Lei 8.137/1990 disciplina os crimes contra ordem tributária, econômica e contras as relações de consumo. Especificamente, o crime tratado no artigo 1º, inciso I da Lei refere-se a "omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias", conhecido como sonegação fiscal.
A decisão proferida entendeu pela configuração da chamada abolitio criminis que se refere a extinção do crime, tendo em vista que diante da existência de uma lei nova a conduta até então tida como crime passa a ser atípica, extinguindo a punibilidade, nos moldes do artigo 107, inciso III do Código Penal. Isso pois, o artigo 2º do Código Penal permite a retroatividade da lei penal mais benéfica.
Nos argumentos de defesa a principal questão levantada foi o fato de que o processo crime que impôs a condenação foi decorrente do fato de que no processo administrativo fiscal o CARF compreendeu pela ocorrência da configuração do crime, de forma que por consequência foi instaurado correspondente processo crime. Contudo, o que se destacou foi que a decisão proferida no CARF foi resultado de um desempate solucionado por meio do voto de qualidade.
Ocorre que o voto de qualidade foi extinto pela Lei 13.988/2020 ao determinar que em caso de empate o caso será resolvido favoravelmente ao contribuinte. Relembro que já tratamos em artigos anteriores sobre o voto de qualidade, modo que recomendo a leitura do artigo "Quais os impactos da decisão do STF sobre a extinção do voto de qualidade?"
Ou seja, considerando que a Lei 13.988/2020 extinguiu o voto de qualidade que resultou na condenação do ora Executado, no momento da decisão proferia essa já se considerava como lei nova e mais benéfica para o Executado, permitindo assim que os efeitos da extinção retroagissem no caso analisado, logo, implicando na extinção de sua punibilidade. Tal fato, como foi fixado na sentença, se verifica não haveria nem que se considerar a constituição de débito tributário, assim de igual modo não há crime contra ordem tributária.
Portanto, mais uma vez verificamos como é importante a análise detalhada do processo administrativo fiscal ainda que a discussão já esteja sendo apreciada pelo Poder Judiciário.
Depreende-se ainda diante do caso narrado como é de suma importância se atentar as relações estabelecidas entre os ramos do direito, no caso direito tributário e direito penal. Vimos que uma questão ocorrida em sede administrativa fiscal foi a principal tese de defesa em um processo de ordem penal, de modo que isso só ressalta ainda mais a relevância de que ainda que não atue propriamente em determinada área do direito é necessário estar sempre atento as principais temáticas debatidas, para que em casos como esse seja possível buscar elementos para argumentação nas outras áreas.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF, 31 dez. 1940. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 25
jul. 2021.
______. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Brasília, DF, 28 dez . 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 25
jul. 2021.
______. Lei nº 13.988 de 14 de abril de 2020. Dispõe sobre a transação nas
hipóteses que especifica; e altera as Leis nº 13.464, de 10 de julho de 2017, e
10.522 de 19 de julho de 2002. Brasília, DF, 14 abr. 2020. Disponível em:
<https://planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/Lei/L13988.htm>. Acesso em: 25
jul. 2021.
SÃO PAULO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Processo nº 0001121-46.2020.8.26.0363. 2ª Vara da Comarca de Mogi Mirim. São Paulo, SP, 10 jun. 2021.
CONSULTOR JURÍDICO (CONJUR). Com o fim do "voto de qualidade" do Carf, juíza anula condenação por sonegação. 17 jun. 2021. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2021-jun-17/mudanca-juiza-anula-condenacao-sonegacao>. Acesso em: 25 jul. 2021.
ESCRITO POR ANA BEATRIZ DA SILVA
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